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Kaio

 

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01 fevereiro 2008

"Turn off your mind, relax and float down stream..."

Passei em segundo lugar para Relações Internacionais no vestibular que a UCG fez nessa semana. Isso quer dizer que os cenários 2 e 4 citados no post "Ironical, huh?" já podem ser descartados. A partir de agora, só há duas possibilidades para o meu primeiro semestre: ou passar na UnB, ou ficar em Goiânia por mais algum tempo, mas já em uma universidade. 20 de Fevereiro será o dia em que conhecerei a hipótese vencedora.
Ufa, é um alívio: finalmente estou desligado do Ensino Médio. Resolvi comemorar esse adeus tão esperado com o início de uma nova leitura: "Laranja Mecânica", de Anthony Burgess. Porém, não é sobre ele que falarei neste post, mas sim sobre os ensaios de Aldous Huxley que li durante os últimos dias.

"As Portas da Percepção" mostra um Huxley um pouco diferente daquele que conhecemos através de "Admirável Mundo Novo", mas sem perder a sua essência. Com isso quero dizer que, a despeito do caráter mais técnico-científico de seu lado ensaísta, algumas características de seu mais famoso romance continuaram intactas, como as descrições precisas, a coerência argumentativa e, é claro, as inúmeras referências e intertextualidades.
Se, em "Admirável Mundo Novo", Aldous faz alusões a Shakespeare e homenageia intelectuais e celebridades nos nomes dos personagens (Bernard Marx, Lenina Crowne, Benito Hoover, Henry Foster...), em "As Portas da Percepção" ele cita várias obras de arte e seus respectivos autores (Botticelli, Van Gogh, Vermeer, Rembrandt...). Em certos momentos, fica a impressão de que estamos a ler um tratado sobre arte e não um ensaio sobre os efeitos dos alucinógenos. Isso não chega a ser um problema; pelo contrário, só enriquece a obra.
Huxley aceitou ser cobaia de experiências científicas sobre a mescalina e as alterações que a mesma poderia causar na mente. Os resultados não poderiam ser mais surpreendentes: além de causar uma sensação de auto-suficiência (talvez por isso o certo desinteresse por relações humanas desenvolvidas pelo usuário quando sob efeito da droga), os psicodélicos, por diminuírem a glicose que vai para o cérebro (e, conseqüentemente, inibirem a transmissão de "pensamentos utilitários", ou seja, voltados para atividades "primárias", ligados à sobrevivência), possibilitam que o indivíduo tenha seus sentidos amplificados, possibilitando uma percepção mais intensa da realidade. É como se tudo existisse por si só, e você se despersonalizasse naquilo que vê, ouve, sente...
A frase que inspirou o nome do livro passa a fazer sentido quando observamos os efeitos da mescalina. "If the doors of perception were cleansed everything would appear to man as it is, infinite" - dita por William Blake - sintetiza a idéia de que, seja através de uma droga ou por hipnose, o ser humano poderia ver o mundo de uma maneira bem mais ampla e nítida, visto que conseguiria minimizar o poder do cérebro em canalizar e restringir pensamentos relativos a questões "secundárias". Aldous Huxley, a respeito disso, afirma que é como se a memória fosse muito mais destrutiva do que construtiva, impossibilitando-nos de relembrar fatos considerados desimportantes para a sobrevivência.
Nas páginas finais, "As Portas da Percepção" chega ao seu ápice. O autor resolve fazer uma análise mais sociológica, e constata que, realmente, todas as sociedades utilizaram algum tipo de droga, seja para mera recreação ou associando-se a algum ritual religioso. Não por acaso, é possível identificar as visões que os ascéticos tiveram com experiências ligadas a psicodélicos e/ou atividades que causam o mesmo efeito que eles (por exemplo, passar dias sem comer para deixar o nível de glicose cair e as alucinações começarem). Portanto, a nossa noção de Deus, do Onisciente está diretamente associada a essas portas na muralha de nossa mente! Com isso, a hipocrisia de alguns ao afirmar que a humanidade poderia algum dia ficar livre das substâncias psicotrópicas é visível.
Mesmo assim, Huxley não deixa de se preocupar com um certo detalhe: a necessidade de uma droga que não cause tantos efeitos colaterais a médio e longo prazo. Obviamente, o álcool e o tabaco estariam longe de tal ideal, e mesmo a mescalina poderia ser perigosa para usuários que tivessem predisposição a certos distúrbios psíquicos. Seria ele, sob certo prisma, um dos idealizadores/profetas de sintéticos como o LSD ou o ecstasy? Ou, como diria a gíria nadsat de "Laranja Mecânica", o sintemesc? De qualquer maneira, o raciocínio dele não deixa de ser extremamente lúcido e avançado para a sua época (a propósito, o livro foi escrito nos anos 50).
O outro ensaio, "Céu e Inferno", é um pouco menos interessante, talvez porque seja mais prolixo. Huxley passa páginas e mais páginas falando sobre obras de artes e outros tipos de representações do "Outro Mundo" na vida terrena. Por exemplo, em certo momento ele constata que até o interesse humano por pedras preciosas e luzes aparece na idealização do universo formado pelos "antípodas da mente". O destaque fica para as cinco páginas em que ele fala sobre o lado infernal que as alucinações podem adquirir. Condições mentais desfavoráveis são o fator fundamental para isso, e os esquizofrênicos estão entre os que mais sofrem com a face mais soturna das experiências visionárias.

Gostaria de ter sido mais profundo nessa resenha, mas já estou meio cansado. Quem sabe eu faço algumas notas e apêndices em outra postagem?
Obs.: Estou adorando o livro "Laranja Mecânica"!

 

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